Os erros e acertos do filme “Contágio”

 Os erros e acertos do filme “Contágio”

Beth Emhoff, personagem de Gwyneth Paltrow, em “Contágio”. Divulgação

 A escritora e biomédica Cristina Lasaits expõe sua visão sobre a obra, depois de reassisti-la

Por Cristina Lasaits

Ontem assisti novamente ao filme “Contágio”, de 2011, para avaliar o que ele acertou e errou sobre o cenário de uma pandemia.

O MEV-1, vírus fictício do filme, é um agente super infeccioso que se transmite pelas secreções e através do ar (exatamente como o covid-19), porém tem um período de incubação curtíssimo de 1 dia e costuma matar os doentes de encefalite em questão de dois dias, com uma letalidade de cerca de 25% (segundo mencionado, embora o filme não mostre pacientes curados).

Alguns paralelos do filme com a realidade atual são impressionantes, por exemplo, o fato do vírus ser um mutante originário dos morcegos e com foco inicial na China (Hong Kong?), o modo de transmissão parecido com a SARS, os sintomas iniciais de febre e tosse, a rápida disseminação pelo mundo…

O filme tem até sua própria “cloroquina”, uma panaceia milagrosa do primeiro momento, e ainda traz o cenário das fake news, dos hospitais de campanha erguidos da noite para o dia e das quarentenas levando ao caos social.

Mas o roteiro definitivamente se perde na cronologia dos acontecimentos da pandemia, dos problemas que traz e das respostas que demanda.

Em poucos dias são milhões de infectados, e a despeito disso ocorre um plot de “abafa o caso” por parte das autoridades que o roteiro não consegue sustentar.

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O panorama político é muito mal endereçado, e o espectador fica sem entender que medidas os governos adotam (se é que as tomam) perante a pandemia; apenas quarentenas súbitas e não informadas atravessam o caminho dos personagens. Ah, e a vacina é produzida em um tempo impossível.

Mas o que mais me chamou a atenção é como o cenário de uma pandemia era inantecipável, mesmo com muito esforço de imaginação, para quem nunca tinha vivido uma.

É muito interessante notar como o filme “Contágio” não conseguiu internalizar nas suas cenas as medidas de segurança que seus próprios personagens especialistas preconizam.

Trailer do filme “Contágio”

O mesmo médico que alerta para a necessidade do isolamento social não se preocupa em manter uma distância segura dos interlocutores nem evita apertos de mão.

Quase ninguém se preocupa em manter distâncias, usar máscaras ou equipamento de proteção de forma regular.

Muito da comunicação é presencial, com personagens fazendo visitas e reuniões que poderiam ter sido uma videoconferência.

A maior descoberta que fiz reassistindo “Contágio” é como a realidade da pandemia é estranha demais até para um filme sobre pandemia.

Como filmar uma cena em que todos estão de máscara e distantes uns dos outros? Como criar tensão em uma cena de reunião, se as pessoas conversam por uma tela e não podem atirar uma caneca de café na outra em uma explosão de raiva?

Com personagens evitando se encontrar, operando contatos a partir de casa?

Só consigo concluir que esse seria um filme alienígena para um público que, em 2011, nunca tinha vivido uma pandemia e que não fazia a menor ideia de como se parece uma.

Para conhecer mais sobre Lasaits, visite o site https://cristinalasaitis.wordpress.com/

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