As origens das quadrilhas juninas

 As origens das quadrilhas juninas

Quadrilha Sapeca. Festival de Quadrilhas Juninas Infantis 2013, Sítio Trindade, Recife. Foto: Andréa Rêgo Barros/PCR

Originária das velhas danças populares das áreas rurais da Normandia e da Inglaterra, as quadrilhas juninas chegam ao Brasil através dos mestres franceses Milliet e Cavalier, como uma das danças de salão preferidas pela nobreza do século XVIII e XIX

Por Manoel Constantino
Projeto Brincantes – Prefeitura do Recife

Ao lado do sentimento religioso que o Ciclo Junino desperta na população, também o sentido de “festa” se amplia com as brincadeiras, as superstições e sobretudo com a musicalidade e a dança, expressões nítidas e fortes no jeito de ser nordestino.

As festas juninas têm início no dia 19 de março, dia de São José, justamente quando se dá o plantio do milho, cereal básico de toda a culinária do período junino.

E a partir de então percebe-se a movimentação de artistas que se dedicam, como compositores e intérpretes, ao forró, xaxado, coco e ciranda, divulgando suas músicas, seus grupos de danças típicas e seus shows.

Paralelamente ao trabalho dos produtores culturais, a juventude também inicia o natural burburinho de ensaios de quadrilhas – a dança típica do ciclo junino.

Origens das quadrilhas juninas

Originária das velhas danças populares das áreas rurais da Normandia e da Inglaterra, a quadrilha chega ao Brasil através dos mestres franceses Milliet e Cavalier, como uma das danças de salão preferidas pela nobreza do século XVIII e XIX.

O pesquisador Lula Gonzaga diz textualmente que a quadrilha “tornou-se uma das mais animadas danças de salão da Europa, nos Estados Unidos e no Brasil durante o século XIX. Esta dança palaciana teve gosto na França no século XVIII, sendo muito popular na era napoleônica. Foi registrada na Inglaterra em 1815 e em Berlim em 1820.

A data desta manifestação no Brasil foi possivelmente em 1820, quando sua presença era notada em festas palacianas em várias comemorações e até no carnaval.

No Brasil, os grupos da elite imperial, que procuravam acompanhar o gosto europeu em termos de moda, leitura, danças, e até comida, trouxeram o costume daquele continente no início do século XIX.”

Esses costumes popularizaram-se de tal forma e em toda a parte, que perderam um pouco de sua pose aristocrática, saindo dos salões palacianos para ruas e clubes populares.

Tradição 2019 – 35º Festival Pernambucano de Quadrilhas Juninas

Dança palaciana

Enquanto dança palaciana, de elite, a Quadrilha tinha cinco partes com marcação em francês. Lula Gonzaga nos passa as informações mais importantes:

1ª parte: La chaine continue des dames (a corrente contínua de damas).
2ª parte: La nouvelle Traine (a nova corrente).
3ª parte: La corbeille (a cesta de flores).
4ª parte: Double pastourelle (dupla pastorinha).

Essas partes eram no andamento Alegro e Alegretto e finalmente, a 5ª parte: Boulangère (padeira) ou Casescroise (quebrado-cruzado). A quadrilha terminava por “En avant” geral ou “Galope”, mais tarde modificado como polca, mazurca ou valsa.

Conforme Roberto Benjamin, “a quadrilha, hoje associada ao casamento matuto vai se transformando em um folguedo de natureza complexa. O casamento matuto é a representação onde os jovens debocham com muita liberdade e malícia da instituição do casamento, da severidade dos pais, do sexo pré-nupcial e suas consequências, do machismo, etc. Tal representação crítica acaba por reforçar os papéis sociais e os valores da moral tradicional.

Um aspecto deve ser evidenciado – os festejos juninos são a festa da adolescência, e da juventude, talvez ainda como uma reminiscência dos ritos de fertilidade”.

Lumiar 2019 – 35º Festival Pernambucano de Quadrilhas Juninas

Casamento matuto

O enredo é simples: a noiva quase sempre está grávida; os pais da noiva obrigam o noivo a casar; este se recusa; é necessária a intervenção da polícia; depois o casamento se realiza com o padre fazendo a parte religiosa e o juiz fazendo o casamento civil, sob as garantias do delegado e seus soldados. A quadrilha é o baile de comemoração do casamento. O enredo é desenvolvido em liguagem alegórica, satirizando a situação, às vezes, em palavreado chulo.

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Personagens das quadrilhas juninas

O casamento matuto é representado pelos participantes das quadrilhas juninas. Os personagens são: os noivos, os pais do noivo, os pais da noiva, os padrinhos e as madrinhas, o padre, às vezes, o sacristão, o delegado, às vezes, com alguns soldados, o juiz com o escrivão; os demais integrantes do grupo são convidados. Incorporam também uma rainha e princesas do milho ou da espiga, escolhidas através da venda de votos, que é uma forma de angariar recursos financeiros para cobrir as despesas.

Coreografia nas quadrilhas juninas

ANAVANTUR (EN AVANT, TOUT) – cavalheiros tomam as damas e andam de mãos dadas até o centro do salão, encontrando-se com a fila da frente.

ANARRIÊ (EN ARRIÈRE) – os pares, ainda de mãos dadas, voltam em marcha-ré até o ponto em que estavam e se separam, ficando cavalheiros em frente às damas.

TRAVESSÊ DE CAVALHEIROS (TRAVESSER) – as damas ficam paradas e os cavalheiros atravessam o salão parando em frente à dama do outro par, cujo cavalheiro faz também o mesmo. Ao se encontrarem com as damas dos pares da frente, dâos-se os braços, fazem duas meias-voltas, indo depois para seus lugares.

TRAVESSÊ GERAL – as duas filas atravessam o salão ao mesmo tempo, cruzando-se no centro pela direita. Ao chegarem aos lugares voltam a ficar de frente para o par.

BALANCÊ COM O PAR VIS A VIS – seguem somente os cavalheiros e ao se encontrarem com as damas, vão entrelaçando o braço direito no braço direito da dama. Dão duas voltinhas e retornam a seus lugares, ficando de frente para o par.

BALANCÊ COM SEUS PARES – cavalheiro de frente para sua dama. Ambos fazem o balanceio, sem sair do lugar.
GRANDE CHÈNE (GRAND CHAÍNE) CRECHÉ OU GARRACHE – a dama dá a mão direita ao cavalheiro e este a mão esquerda à direita de outra dama e passam a trocar de mãos e de dama até que voltam a encontrar os seus pares.

SANGÉ (CHANGÊ DE DAME) – os cavalheiros rodam as damas pela sua esquerda, passando-as para trás e a cada sinal do marcador, largam as mãos das mesmas e vão pegar as da sua frente até chegarem aos pares certos.

BEIJA FLOR – os pares seguem até o meio do salão, as damas estendem a mão direita para o cavalheiro beijar.

CORTESIA – os cavalheiros dão um passo para trás sem largar a mão da dama, ficando semi-ajoelhados. As damas dão duas voltinhas pela esquerda, os cavalheiros levantam-se e aguardam o próximo passo.

CRUZ DE MALTA – os casais ímpares continuam rodando e os números pares vão-se infiltrando na roda, segurando-se nos punhos e formando rodas maiores. Os cavalheiros seguram nas mãos dos cavalheiros e as damas seguram nas mãos das damas, formando outro braço da cruz. Continuam rodando ao ritmo da música.

PASSEIO DOS NAMORADOS – o par guia sai com sua dama pela direita, o par seguinte sai pela esquerda e os demais vão imitando. Quando se encontram novamente, formam uma fila única, depois uma roda no meio da sala.

CAMINHO DA ROÇA – damas na frente, cavalheiros atrás, percorrem todo o salão, voltando aos seus lugares.

AÍ VEM CHUVA – todos fazem meia volta, marchando em sentido contrário.

É MENTIRA – Nova meia volta. Continuam marchando em roda.

CESTINHA DE FLORES – as damas levantam os braços, passando-os por cima dos ombros com a palma das mãos para cima. Os cavalheiros que estão atrás seguram as mãos da dama e continuam a marchar.

A PONTE CAIU – os cavalheiros sem largar as mãos das damas, fazem meia-volta e seguem a marcha na frente das damas.

PONTE NOVA – todos fazem meia volta pela direita sem largar as mãos das damas, continuam a marchar.

DAMAS AO CENTRO – damas formam a roda e os cavalheiros outra, por fora. Rodam todos no mesmo sentido, para a esquerda.

ARCO-ÍRIS – damas passam a roda para a direita, ficando as duas filas rodando em sentido contrário.

DAMAS EM RODA – os cavalheiros entram para dentro da roda sem largarem as mãos. Damas fazem a roda por fora e todos começam a rodar pela esquerda, procurando seus pares.

OLHA O TÚNEL – o par guia dá as mãos, levantando-as à altura dos ombros. O par próximo ao guia passa por baixo, e coloca-se ao lado, na mesma posição. Todos os demais pares fazem o mesmo.

CARACOL – os pares fazem fila indiana e a dama do par guia começa a marcha em direção ao centro do salão. Quando o caracol estiver bem unido, todos esperam a ordem do marcador.

Fim de festa

As opiniões divergem bastante, entre os pesquisadores e até entre os organizadores de quadrilhas juninas, mas o que importa, e independente da evolução e dinâmica que hoje se detecta no Ciclo Junino, é que a Festa do Fogo ainda aglutina, ainda provoca o sentimento de comunidade, de integração e, o que é mais importante, o sentimento de alegria, onde a dança, os gestos, o sorriso, a música – seja ela eletrônica ou com orquestra tradicional – determinam o jogo, a brincadeira, tão necessários à alma do ser humano, seja numa representação caricatural, seja ela tradicionalmente vinculada à espontaneidade do homem do campo.

Bibliografia

SILVA, Leny de Amorim (org.) (1992), Ciclo Junino. Prefeitura da Cidade do Recife – Secretaria de Planejamento e Urbanismo – Museu da Cidade do Recife.

CASCUDO, Luís da Câmara (1989). Dicionário de folclore brasileiro. Editora Melhoramentos. São Paulo.

PARECER SOBRE O CICLO JUNINO, de Fernando Augusto G. Santos, Recife: 1993. Fundação de Cultura Cidade do Recife – Departamento de Formação e Descentralização Cultural.

ARÁUJO, Alceu Maynard, 1964. Folclore Nacional. Editora Melhoramentos.

BENJAMIN, Roberto Emerson Câmara, 1989. Folguedos e Danças de Pernambuco. Fundação de Cultura Cidade do Recife (Coleção Recife – Vol. 5).

PEREIRA DA COSTA, F.A., 1974 . Folclore Pernambucano. Arquivo Público Estadual . 1a edição autônoma.

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