Festival Rec-Beat no Cais da Alfândega. Foto: Ariel Martini
Uma semana de festival, umas 40 atrações diferentes, incluindo Ira!, Fellini, Mestre Ambrósio, Mundo Livre S/A e Pedro Luís e a Parede, um público pra lá de animado e, principalmente, uma grande demonstração de força: tudo isso aconteceu em pleno carnaval
Por Marcelo Firpo
Ao chegar ao Recife em pleno sábado de carnaval, lembrei da primeira vez que vi Chico Science. Foi numa loja de revistas no Shopping Praia de Belas, no começo dos anos 90. Ele estava na capa da General, e eu, passando de relance, pensei: “Ih, olha só o Edu K na capa da General!” Até aquele momento, só tinha ouvido falar muito por cima da tal cena manguebeat e achado a coisa toda de uma pretensão absurda. Ainda mais vendo aquele desconhecido, que nem disco lançado tinha, todo metido na capa da revista, cercado por duas mulheres. A primeira impressão foi de que não era coisa séria.
Publicado originalmente no site MangueNius – mantido por AD Luna. Título original: “RecBeat 2000 – O mangue manda” – LINK ORIGINAL
Corta pro presente
Estou chegando a um Recife estranho para mim, às 22h30, sem reserva em hotel, no sábado de carnaval. Aqui, a primeira impressão também é das mais esquisitas: a passagem do bloco Galo da Madrugada, durante a tarde, deixou o centro com cara de terra arrasada — montes de lixo por todos os lados, asfalto grudento, gente jogada aqui e ali e um fedor pesado de mijo e cerveja choca.
O hotel que consigo parece um oásis no meio dessa zona, e o Velho Que Eu Estou Me Tornando insiste que talvez seja melhor dormir cedo e conhecer a cidade no dia seguinte. O Guri Que Resiste argumenta que só temos quatro noites e ainda dá pra pegar, no mínimo, o show do Mundo Livre S/A. É isso aí. Rua da Moeda, Recife Antigo, lá vamos nós.
Imagine o Largo Glênio Peres, aqui em Porto Alegre. Agora cerque-o com prédios antigos. Pinte quase todos com grafites coloridíssimos. Dentro dos prédios, coloque uns bares legais, mesas na calçada, aquela coisa toda. Num dos extremos da rua, um palcão. No outro, um asfalto cheio de skatistas andando pra lá e pra cá na transversal. Bote umas árvores grandonas aqui e ali, estilo Praça da Alfândega.
Foi?
Agora, o principal: lote o lugar de gente amigável, alternativa sem ser besta e antenada sem ser chata. Como é carnaval, bote um monte de fantasiados e fantasiadas (tinha até a gangue do Laranja Mecânica!) e acrescente uma atmosfera de alegria quase infantil, sem qualquer afetação.
Pronto, agora pode abrir o sorriso que eu abri quando cheguei no RecBeat.
Uma semana de festival, umas 40 atrações diferentes, incluindo Ira!, Fellini, Mestre Ambrósio, Mundo Livre S/A e Pedro Luís e a Parede, um público pra lá de animado e, principalmente, uma grande demonstração de força: tudo isso aconteceu em pleno carnaval, rivalizando com um monte de shows e desfiles por todo o Recife — sem falar em Olinda, que fica do lado.
Se eu tinha alguma desconfiança em relação à legitimidade interna do manguebeat — e eu tinha — ela foi Capibaribe abaixo em dois tempos.
O troço é de verdade, não é uma armação pra executivo de gravadora ver, não é uma piração de meia dúzia (talvez até tenha sido no começo, mas quem se importa agora?), não é um pastel de vento. Na real, dá pra ver que a galera tem orgulho da cena e suas ramificações, e aceita de peito e cabeça abertos a proposta de “Pernambuco embaixo dos pés e a mente na imensidão”.
O que mais poderia explicar o magrão de camiseta do Deicide que eu juro que vi dançando maracatu?
Agora, os shows, pelo menos os que vi:
A terceira noite era a mais roots de todas.
Mas o grande absurdo foi o Encontro dos Mestres do Maracatu.
Pausa para um momento Discovery Channel: existem dois tipos de maracatu:
O RecBeat promoveu o encontro dessas tradições, levando pro palco e dando um status mais popstar a uma manifestação cultural que normalmente acontece na rua.
Pra não me alongar na descrição, só conto uma coisinha: a apresentação começou com o Maracatu Nação Estrela Brilhante, do qual participam músicos do Mestre Ambrósio e Cascabulho. Após uma introdução linda só com uns vocais bem nordestinos, o couro comeu solto nos tambores, e foi impossível não lembrar de Chico.
Aí, me viro pra comentar isso com a repórter do meu lado e percebo que a mina está literalmente lavada em lágrimas. Juro.
E fora o que vi, teve também o que me contaram:
A cena e a cidade fervem. Só no morro do Alto José do Pinho, base dos Devotos, existem hoje 78 bandas em atividade, a maioria desenvolvendo trabalhos comunitários em paralelo.
Cena final: já longe do RecBeat, indo pro aeroporto, passo perto de um sistema de som no meio da rua que, entre um axé e outro, toca “A Praieira”. Todo mundo em volta canta junto, com orgulho.
No avião, eu já sentia saudades até do mijo e da cerveja choca.
Atualização Interd. Confira a programa do RecBeat 2000
DJ Paulo Paris
John Bigu e Os Caronas
Querosene Jacaré
DJ Marc Reigner
Monica Feijó
Songo
Sistema X
Eddie
Mestre Ambrósio
DJ Arlequim
River Raid
Stela Campos
Chão e Chinelo
Ira!
Faces do Subúrbio
DJ Angel e DJ Alistar
Sonic Jr
Matalanamão
DJ Dolores
Pinduca
Mundo Livre S/A
DJ Renato L
Los Canalhas Insensibles
Uptown Big Band
Fellini
Pedro Luis e a Parede
Via Sat
DJ Caphagérson
Método Tufo de Experiências
Lia de Itamaracá
Ortinho
Encontro de Mestres
Naná Vasconcelos
DJ Cliffy
Paula Lima
DMP e Os Fulanos
Textículos de Mary
Karnak
Cordel do Fogo Encantado
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