Ciência e saúde

Produtos naturais, produtos farmacêuticos e o método científico

O método científico é fundamental no desenvolvimento de medicamentos. Dividido em várias etapas, ele garante que uma droga seja eficaz e segura, levando-se em conta se os benefícios superam os riscos

Por Clara Marques*

O que faz uma substância placebo ou não e como se dão as etapas de produção de medicamentos? O farmacêutico, doutor em Ciências Fisiológicas André Bacchi explica como o método científico é aplicado na indústria farmacêutica e como as premissas do desenvolvimento de novas drogas terapêuticas. André também é professor e coordenador do Grupo de Estudos em Medicina Baseada em Evidências e Divulgação Científica da Universidade Federal de Rondonópolis (UFR), no Mato Grosso. 

O pesquisador comenta que os produtos tidos como “naturais” não passam pelos rigorosos processos pelos quais as drogas convencionais passam. Isso é um problema principalmente porque nem tudo que vem da natureza, sem nenhum tratamento ou processamento é sublime, divino e não causará nenhum problema.

“Muita coisa que não é tida como natural salva vidas, e muitas coisas que são consideradas naturais podem matar. A gente não pode associar o que é natural com maior segurança. Não se pode associar o que é natural com maior benefício, até porque muitos desses produtos naturais que prometem uma série de coisas não conseguiram demonstrar essa eficácia toda por meio do método científico”, expõe Bacchi.

Ouça entrevista com André Bacchi para o programa InterD

Listen to “O cuidado com produtos e medicamentos “naturais”, com André Bacchi #22″ on Spreaker.

Paranoia ou mistificação? 

Os produtos vendidos como naturais clamam um movimento de resistência contra um cenário de “hiper medicalização”. No entanto, essa hiper medicalização é muito mais intrincada socialmente, do que simplesmente a indústria farmacêutica e seu lobby de vendas e marketing médico.

Ter um pensamento irracional sobre os tratamentos desconsidera a importância de testes em escala populacional, evidências científicas, análise de risco-benefício e custos financeiros que impactam não só o indivíduo, mas toda uma sociedade.  

Para André Bacchi, é importante que tenhamos certa dose de cetismo. “Mas, no momento em que as evidências científicas adequadas são apresentadas para mim, eu devo aceitar a evidência, devo ceder a essa evidência, e aí vou estar tendo um bom equilíbrio entre duvidar sempre que eu posso, mas, ao mesmo tempo, aceitar quando a evidência aparece”. 

Farmacologia e método científico 

O método científico é fundamental no desenvolvimento de medicamentos. Dividido em várias etapas, ele garante que uma droga seja eficaz e segura, levando-se em conta se os benefícios superam os riscos. Se o método científico não é considerado no desenvolvimento de uma medicação, é praticamente impossível ter segurança no uso da substância. 

André Bacchi explica que os testes seguem um roteiro específico. Primeiro, são observadas, a partir de hipóteses, como determinadas substâncias reagem em células, tendo-se uma ideia do potencial de funcionamento. Após esse momento, começam, de fato, as etapas clínicas, em pequenos grupos de pessoas. Aqui, são observadas tolerância e possíveis efeitos adversos, determinando-se as doses seguras.  

A fase dois (ou secundária), é o momento em que o medicamento já se apresenta bastante promissor, com indícios de eficácia e segurança. Sendo aprovada aqui, a molécula segue para a fase 3, ou chamado “ensaio clínico”.  

No ensaio clínico, os pacientes são divididos em grupos, sendo que um receberá um placebo (ou pílula de farinha, por exemplo) e outro receberá o medicamento efetivamente testado. Nem os pacientes, nem os profissionais aplicadores sabem quem está recebendo o que, mas apenas um restrito número de pesquisadores.

“Todas essas etapas estão em consonância com o método científico. E, por conta disso, são as informações mais confiáveis que a gente pode ter a respeito de um determinado medicamento, de um determinado tratamento”. finaliza. 

*Versão em texto para entrevista de André Bacchi concedida a AD Luna no InterD

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