“Não existem experiências religiosas, antigas ou contemporâneos, que não sejam fundadas por mitos. O que é mística em qualquer campo religioso? É mito, magia e religião. Então é claro que se pode falar de uma mitologia cristã”
Por AD Luna
@adluna1
Aparentemente, muitos cristãos não gostam de ter suas crenças tratadas como mito. Não obstante tal rejeição, podemos falar em mitologia cristã? Convidado da edição #96 do InterD – música e conhecimento, o historiador e professor André Leonardo Chevitarese, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), tratou da questão no programa.
“Não existem experiências religiosas, antigas ou contemporâneos, que não sejam fundadas por mitos. O que é mística em qualquer campo religioso? É mito, magia e religião. Então é claro que se pode falar de uma mitologia cristã. Os cristãos acreditam na narrativa da criação, tal como posta em Gênesis 1; e numa outra narrativa da criação em Gênesis 2. Isso é mito. Não tem nada de história nisso”, alega André Chevitarese.
O historiador observa que religiosos fundamentalistas tratam a criação do mundo por Deus como se fosse uma realidade objetiva e para rivalizar com a teoria da origem das espécies de Charles Darwin. “Isso é a cabeça de gente muito ruim da cuca, gente complicada, que quer forçar, que quer meter o pé na porta da ciência, arrombar a ciência. Isso não é mais possível, acabou”, critica.
“Ali não se demonstra nada. Ou você tem fé e acredita ou você não tem fé e acabou. Isso é mito. Há mitologia judaica, cristã, islâmica. Um mensageiro veio do céu e se revelou ao profeta Muhammad (Maomé)… Isso é história, ciência?”, reforça.
Joseph Smith
Chevitarese também cita os mórmons ao tratar de mitologia. “Joseph Smith [primeiro presidente da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias], no século 19, é visitado por anjos que vêm trazer para ele um livro, tábuas de ouro. Isso é o quê, história? Isso é mito”.
Ainda assim, ele chama a atenção para a visão de que o mito não é um relato mentiroso. “É uma outra forma de contar uma história. Muito mais gente experimenta o estado alterado de consciência do que o oposto. Inúmeras, infinitas experiências religiosas estão completamente mergulhadas, inseridas, nesses campos de experiências religiosas estáticas, do indivíduo sair de si, encontrar com a divindade. Isso é bem estudado pela antropologia, pela psicologia, em inúmeros trabalhos de campo, em diferentes comunidades religiosas dispersas pelo globo”, informa.
“Então, deixa os cristãos espernearem, deixa eles fazerem biquinhos, ficarem de mal. Mas toda e qualquer experiência religiosa tem sua parte que é mítica. Ponto. Os que querem ficar chateados que fiquem. O que se vai fazer? É um problema de cada um”, salienta André Chevitarese.
Ouça a entrevista com o professor André Chevitarese na íntegra
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INDICAÇÃO DE LEITURA
“A Descoberta do Jesus Histórico” – André Chevitarese
A coleção “Quem dizem que sou?” é um espaço interdisciplinar que acolhe as mais variadas abordagens e interpretações da figura marcante de Jesus de Nazaré: a exegese, a teologia, a literatura, a história, a espiritualidade e tantas outras.
Este livro mescla abordagens de variados pontos de vista teóricos, todos contribuindo para formar uma imagem complexa do Jesus histórico; agenciam se as fontes de maior tradição, como os textos canônicos, e são incorporados documentos não menos importantes, mas que refletem, justamente, a imensa diversidade existente na época de Jesus.
Assim, textos gnósticos, histórias das correntes judaicas, tradição textual, cultural material e iconografia, disso tudo se trata, numa riqueza e variedade fertilizadora; a obra congrega, de forma muito bem articulada, a ciência internacional e a brasileira.
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