Estratégia pioneira do Butantan se mostrou superior ao teste convencional e conseguiu identificar a doença, em fase inicial, em mais de 70% dos pacientes com resultados falsos negativos
Pesquisadores do Instituto Butantan, órgão ligado à Secretaria de Estado da Saúde (SES) de São Paulo, desenvolveram em laboratório uma proteína quimérica para o diagnóstico da leptospirose, que se mostrou superior ao teste padrão, conhecido como microaglutinação (MAT), atualmente recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Ainda na fase inicial da infecção, a estratégia conseguiu detectar a doença em mais de 70% dos pacientes que tinham obtido resultados falsos negativos nos primeiros dias de sintomas.
Criado pelo grupo da pesquisadora Ana Lucia Tabet Oller Nascimento, do Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do Butantan, o teste utiliza uma proteína quimérica recombinante, construída de forma sintética e denominada rChi2, composta por fragmentos das 10 principais proteínas de superfície da bactéria Leptospira – aquelas que o sistema imune detecta mais rápido durante uma infecção. O estudo foi publicado na revista Tropical Medicine and Infectious Disease e os pesquisadores depositaram um pedido de patente em março deste ano.
A rChi2 foi purificada e testada em diagnóstico sorológico do tipo ELISA, que avalia a presença de anticorpos no soro de pacientes por meio da reação com antígenos. A proteína foi reconhecida por anticorpos tanto no início da doença, quando o teste padrão deu negativo, como na fase de recuperação, em 75% e 82% das amostras, respectivamente.
“No diagnóstico convencional, o soro do paciente é colocado em contato com Leptospiras vivas que se aglutinam na presença de anticorpos [resultado positivo]. O problema é que demora mais de 10 dias para o indivíduo produzir esses anticorpos aglutinantes, dificultando a identificação precoce da doença”, explica o primeiro autor da pesquisa Luis Guilherme Virgílio Fernandes, biotecnólogo com doutorado e pós-doutorado pelo Butantan.
Outro obstáculo do teste clássico é a sua complexidade, por exigir uma grande coleção de bactérias Leptospiras vivas, mantidas rotineiramente, e uma expertise significativa dos técnicos que o aplicam. Por isso, o MAT é feito somente por laboratórios de referência, o que acaba reduzindo o seu acesso.
“Vale ressaltar que o teste padrão possui cunho epidemiológico importante e deverá continuar sendo aplicado. Isso porque ele contém culturas de bactérias Leptospira de diferentes sorotipos, ajudando a identificar qual tipo está em maior circulação ou causando epidemias. As Leptospiras patogênicas [que causam doença] possuem mais de 200 sorotipos”, esclarece a pesquisadora Ana Lucia.
O novo diagnóstico também mostrou 99% de especificidade, não apresentando reação cruzada com outras doenças infecciosas como dengue, malária, HIV e Doenças de Chagas, ou seja, ele detecta especificamente os anticorpos contra a leptospirose.
A estratégia do Butantan pode ajudar a identificar a doença ainda na fase inicial, possibilitando o tratamento precoce e melhorando a qualidade de vida dos pacientes. Futuramente, o próximo passo seria desenvolver um teste rápido (semelhante àquele da Covid-19 encontrado em farmácias, chamado de dipstick), utilizando a mesma proteína quimérica. Nesse caso, em vez de secreção nasal, a coleta poderia ser feita por meio da urina ou sangue.
Portal do Butantan: butantan.gov.br
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