Sociedade

Paganismo e neopaganismo: Karina Afrodite e o orgulho de ser pagã #Arquivo

Wicca, paganismo e neopaganismo são temas de estudo da pesquisadora Karina Afrodite, que participou do programa Interdependente

Por AD Luna

Dançarina de tribal fusion, pesquisadora, escritora e fã de metal. Karina Ártemis Afrodite é autora do livro Wicca no Brasil: magia, adesão e permanência, resultado da conclusão do mestrado em Ciências da Religião pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap).

Ela foi a convidada da edição veiculada no dia 7 de outubro de 2017, no Interdependente – música e conhecimento, na Universitária FM do Recife. Abaixo, áudio completo e trechos da entrevista transcritos.

O que é paganismo?

Genericamente, o paganismo é um termo utilizado para identificar as religiões não-abraâmicas – as que tem as suas raízes no Velho Testamento, o cristianismo, judaísmo e islamismo. As religiões não-abraâmicas foram tachadas de pagãs.

Isso surgiu a partir da perspectiva cristã. Quando o cristianismo se torna o centro do poder na Europa, quando Roma se torna cristã, começa a se designar que os que não são cristãos são pagãos. E essa palavra, originalmente não é um termo religioso. Ela vem do latim “paganus”, que significa um camponês, um rústico. E foi utilizada de forma pejorativa.

Porque a gente sabe que o cristianismo é uma religião de convertidos, que se prega o proselitismo e, sobretudo no passado, muito intolerante em relação às outras religiões.

Qual a diferença entre paganismo e neopaganismo?

No século 19, com o movimento romântico, houve um resgate das religiões antigas, pré-cristãs, dos gregos, dos romanos, dos celtas, dos germânicos, para a literatura, para a música. Com isso, passou-se a se ter uma perspectiva menos pejorativa das religiões pagãs.

No século 20, surgiu um movimento que não era mais só de caráter literário ou musical; era religioso, que queria buscar e cultuar os deuses antigos, praticar modernamente as religiões antigas.

Para isso, se utilizou o termo paganismo para identificá-las. Mas você pode perguntar: “por que o pessoal continuou a usar o termo paganismo?” Primeiro, por conta do movimento romântico, já vinha se tendo um sentido do paganismo menos pejorativo. Em segundo, porque você dizer que era pagão seria uma forma de legitimar, [de dizer] que você não era cristão.

Então o termo pagão continuou sendo utilizado para aqueles que modernamente praticam as religiões pré-cristãs, as religiões pagãs da Europa. Para ficar mais claro a diferença entre esses pagãos modernos e os antigos, se coloca o prefixo neo – neopagão, ou paganismo contemporâneo.

Os historiadores utilizam tranquilamente a palavra paganismo pra falar das religiões antigas. Mas os antropólogos utilizam mais xamanismo, politeísmo, animismo, porque eles trabalham mais com tribos.

As religiões que não tiveram ruptura, ao longo do seu desenvolvimento durante os séculos, denominamos só de pagãs, ou paleopagãs, “paleo” é antigo. E, as religiões que sofreram ruptura, , por conta do cristianismo, e que voltamos a praticar chamamos de neopagãs.

Quais foram os primeiros lugares a desenvolver o neopaganismo?

O neopaganismo migrou da Europa para Canadá, Estados Unidos e Austrália, onde foi se transformando, por conta das influências culturais modernas da época, da década de 1960, do feminismo, da contracultura, da ecologia e também vai ser influenciado pelas tradições étnicas desses países – as que estavam lá, antes da invasão da Inglaterra (indígenas, por exemplo).

Muito do que foi para países latino-americanos já foi traduzida pelos Estados Unidos. Aqui no Brasil, por exemplo, chegou a wicca diânica, que justamente vem dos EUA e, tem influência mais xamânica. E aqui também veio a se sincretizar, se mesclar com [práticas dos] nossos indígenas.

Como a wicca entrou na sua vida?

Eu me interessei pela wicca no exato momento em que soube da existência dela. Tinha 14 anos de idade e um amigo meu chegou com um texto impresso da internet, dizendo que iria me interessar – pois eu dizia na escola que era bruxa.

Eu dizia isso por pura intuição, alguma coisa do meu ser. Não tem nenhuma lógica, não tem como definir racionalmente.

Eu sentia e achava isso e pronto… Então, quando li o texto, que falava sobre paganismo e especificamente sobre a bruxaria moderna, chamada wicca.

Quando li [o texto] falando da magia, do culto à natureza, da Deusa, do feminino, me encantei completamente.

Eu estava vendo tudo o que eu já acreditava, tudo que já estava no meu ser. É como se eu estivesse me reencontrando, como se estivesse voltando pra casa. Como se eu estivesse finalmente encontrando quem eu era.

Foi completamente automático. Quando [soube que] já existia o que eu era, pude me encontrar, me expressar no culto da religião, no caso, dos sabás, que são as festividades… Poderia me expressar no mundo e Ser realmente, ser plenamente, ser viva de verdade.

A religião Wicca teve início na década de 50 do século XX na Inglaterra e, desde então, adentrou em diversos outros países, sendo um deles o Brasil, onde o movimento wiccano se encontra consolidado embora seja pouco conhecido e menos ainda estudado. O conhecimento da sua dinâmica social descortina perspectivas interessantes para a compreensão dos novos movimentos religiosos brasileiros.

Este trabalho busca, então, identificar entre os praticantes da Wicca, da Região Metropolitana do Recife, tanto solitários, quanto membros de grupos, os meios pelos quais, e as motivações que, levaram ao ingresso e permanência deles na religião. Para isso foi feito um estudo do desenvolvimento histórico da Wicca na Inglaterra e Estados Unidos, uma pesquisa documental da Wicca no Brasil, e uma história oral e descrição fenomenológica do movimento wiccano no Grande Recife.

Foram aplicados quarenta questionários e feitas quatro entrevistas. A interpretação dos dados obtidos na bibliografia, documentos, entrevistas e questionários apoiou-se no conceito de escolha racional, desenvolvido na sociologia da religião de Stark e Bainbridge. COMPRE AQUI

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