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“O livro dos milagres”, de Carlos Orsi, investiga fenômenos espantosos da religião
“O Livro dos Milagres: O que de fato sabemos sobre os fenômenos espantosos da religião” . Lançado pela editora UNESP, a obra do jornalista Carlos Orsi busca facilitar o acesso do público às conclusões científicas sobre esses eventos tidos como “espantosos” ou “inexplicáveis”.
“Vivemos numa sociedade que trata fenômenos religiosos com especial indulgência, com especial condescendência”. A crítica do escritor e editor-chefe da revista Questão de Ciência a essa desmedida tolerância que se observa na sociedade brasileira foi exposta na edição #12 do programa InterD – música e conhecimento, em entrevista ao apresentador, músico e jornalista AD Luna. Além da íntegra do áudio da entrevista, publicamos a transcrição da conversa.
Ouça “Ciência e milagres, com Carlos Orsi #12” no Spreaker.
Carlos Orsi, qual foi sua principal motivação que o levou a escrever “O Livro dos Milagres”?
Eu diria que, na verdade, foram duas motivações. Uma imediata e uma depois um pouco mais bem pensada. A imediata é algo que me incomoda, que sempre me incomodou muito na mídia em geral, na imprensa, na televisão, etc.
É algo que eu chamo – a expressão é em inglês, mas nunca achei um equivalente em português – de “mystery-mongering”, que seria algo como ‘vendilhão de mistérios’ ou ‘mascate de mistérios’, que é a tendência dos meios de comunicação, até em busca de audiência, de ficar empurrando para as pessoas, como se fossem grandes mistérios ainda em busca de elucidação, fenômenos que, na verdade, já estão muito bem esclarecidos há muito tempo.
Isso tem em várias áreas… a gente pode ver esses documentários intermináveis sobre construção das pirâmides ou sobre busca de Atlântida, são exemplos. E fenômenos religiosos são uma subcategoria e são a subcategoria especialmente perniciosa porque elas são realmente levadas a sério, na imprensa.
Quando você vê um documentário sobre busca de Atlântida, você sabe que isso [não] foi uma coisa muito séria, que vai passar em certos canais específicos, etc.
Mas quando o Vaticano reconhece um milagre de cura, isso sai na sessão séria dos jornais, não na sessão de entretenimento, o que torna isso ainda mais irritante do ponto de vista ético-filosófico, pelo menos pra mim.
Essa foi a motivação imediata. Quer dizer, eu passei anos na grande imprensa, vendo o espaço nobre dos jornais sendo usado para vender para as pessoas a ideia de que os sudários de Turim ou a dança do sol em Fátima, em Portugal, ou vários outros fenômenos que já foram explicados e elucidados à exaustão, na verdade ainda estariam em busca de explicação e, portanto, seriam motivos para acreditar nessa ou naquela doutrina religiosa.
Minha indignação com isso foi o meu primeiro motivo e o mais imediato, mas teve um outro motivo, esse mais pensado, que na verdade eu fui tomando consciência dele enquanto escrevia, que é como esses fenômenos são explorados politicamente.
É muito difícil quando você vai estudar a história de um milagre, por exemplo, uma cura acontecida numa fonte na França, como é o caso de Lourdes, ou as supostas aparições de Maria, da mãe de Jesus, em Portugal, na França, em outras partes do mundo, como essas coisas existem num contexto político; como esses fenômenos, quando eles alcançam dimensão de massa, eles acabam sempre sendo usados, manipulados para empurrar algum tipo de ideologia, para difundir uma série de posições políticas mais do que para promover a fé das pessoas.
Essa promoção da fé que vem dos milagres é manipulada e manipulável politicamente. Isso é histórico. Quer dizer, você percebe que, por exemplo, a mensagem de Fátima é uma mensagem anticomunista.
As aparições de Fátima em Portugal aconteceram numa época em que a sociedade portuguesa estava dividida entre uma esquerda mais progressista e uma reação conservadora.
E as mensagens religiosas geralmente, nem sempre, mas existe um padrão muito claro de que grandes eventos milagrosos que comovem multidões são eventos que sempre surgem em momentos onde a parte mais conservadora da sociedade está precisando de algum tipo de apoio, de um chamado às armas, de algum tipo de novo ânimo. Aí acontece um milagre, que acaba consolidando essa tropa conservadora.
Eu acho que no Brasil, hoje, isso é algo que a gente precisa prestar muita atenção, precisa tomar muito cuidado.
Eu não descarto o fato de que a grande onda de supostos milagres de cura que diz-se que acontecem nos cultos evangélicos e, sobre os quais escrevo no livro, essa questão da cura que acontece em momentos de grande carga emocional, com muita gente reunida, com um sacerdote, um pastor aos berros, não são curas legítimas.
A pessoa se sente curada porque ela tem aquele pico de adrenalina, aquela alegria no momento e ela acha que melhorou e não melhorou.
Descrevo um caso muito triste no “Livro dos Milagres” de uma mulher nos EUA que acabou tendo uma fratura de vértebra porque ela saiu correndo no meio de um culto evangélico porque ela achou que tinha sido curada.
Quer dizer, essas coisas são perigosas. Mas, enfim, voltando ao raciocínio inicial, eu não descarto que esse entusiasmo religioso do neopentecostalismo tenha sido um dos fatores que permitiu consolidar a massa conservadora que acabou viabilizando o momento trágico que o Brasil vive hoje.
Então, para resumir a resposta, foram duas motivações básicas. Primeiro expor essa questão dos vendilhões de mistério e de muitas coisas que a mídia tenta vender como mistérios para conseguir audiência, que não são mais mistérios há muito tempo.
E, segundo, expor que muitos desses fenômenos tidos como milagrosos na verdade são focos de exploração política. Não que eles sejam deliberadamente provocados, como algum vilão que imagina “Ah! Vou inventar um milagre agora para consolidar a consciência conservadora!”, mas a consciência conservadora, quando entra em crise, começa a procurar coisas que ela possa chamar de milagre e quem procura, acha.
E o livro é também pra mostrar isso: quem procura, acha, e nem tudo que se acha e que se diz que é milagre, na verdade, é.
Essas coisas, quando examinadas de forma racional e científica, tem explicações que independem de qualquer tipo de intervenção divina ou sobrenatural.
Na sua visão, por que a imprensa e a sociedade brasileira são tão condescendentes com os fenômenos religiosos, tidos como milagrosos ou sobrenaturais, se a gente dá uma olhada aí nesses programas de TV evangélicos, cheios de “milagres”?
Olha, a imprensa brasileira é condescendente com as alegações milagrosas, quando não reverente – condescendente ou reverente, dependendo do órgão de imprensa, da tradição do veículo -, porque a imprensa é parte da sociedade, a imprensa reflete os valores sociais.
E nós vivemos numa sociedade que trata fenômenos religiosos com especial indulgência, com especial condescendência porque existe esse senso comum, esse consenso social de que religião, no geral, é uma coisa boa.
E as pessoas que acreditam em valores religiosos, em crenças religiosas são pessoas mais éticas e são pessoas mais felizes, e, então, nós temos que alimentar esse tipo de sentimento porque esse sentimento traz consolo e impõe freios éticos. Eu obviamente discordo disso.
Eu acho que, realmente, religião pode trazer consolo e impor freios éticos para algumas pessoas, mas eu não acho que as pessoas precisem de religião para encontrar consolo nas tragédias da vida, nem para encontrar limites éticos, e que tem alternativas que trazem os mesmos benefícios que a crença religiosa e nenhum dos malefícios.
Entre os malefícios está a aceitação acrítica de afirmações feitas sem evidência, a obediência acrítica a figuras de autoridade, só porque essas figuras têm um certo carisma e se dizem porta-vozes de certas forças sobrenaturais.
Então eu acho que… condescendência não é exatamente a palavra… acho que a indulgência ou a deferência especial dada pela sociedade brasileira à religião vem disso.
Dessa ideia de que é melhor com religião do que sem ela, e de que você não pode tirar das pessoas uma fonte de consolo – e talvez de normas éticas de comportamento.
Mas aí a gente cai no que eu gosto, um paradoxo que vem da Grécia antiga, que é os deuses amam o que é certo porque essas coisas são certas ou as coisas são certas porque os deuses as amam?
Se é o primeiro, se o certo existe e os deuses gostam do que é certo, então você pode fazer só o que é certo, não precisa de nenhum deus pra te dizer isso.
Por outro lado, se as coisas só são certas porque os deuses dizem que elas são certas, então deus pode decretar que matar os outros é certo, que mutilar crianças é certo, que sacrificar pessoas é certo, e a gente sabe que isso acontece.
Ao longo da história, isso já aconteceu várias vezes… os deuses podem decretar que votar no Bolsonaro é certo, enfim, coisas do gênero. Então eu acho que é mais fácil a gente assumir que o certo é certo e nós não precisamos de nenhuma autoridade sobrenatural para nos dizer isso, do que ficar esperando que os porta-vozes das autoridades sobrenaturais nos digam o que é certo, porque esses porta-vozes podem acabar dizendo muita besteira.
O que fazer a respeito? Eu acho que tem ações políticas e ações individuais. Ações individuais é o que eu tento fazer, que é fazer com que a informação correta circule.
Por exemplo, como no caso dos milagres, explicando que supostos milagres não são razão para acreditar no que autoridades religiosas dizem. E mostrar que existem alternativas, que é possível viver uma vida ética sem esse tipo de crença.
E alternativas políticas são agir politicamente para reduzir a influência que essas denominações, organizações, igrejas, etc. têm no cenário. Porque elas têm alguns tipos de influência que não são exatamente legítimos.
Por exemplo, canais de TV, que são concessões públicas, no caso da TV aberta, arrendam horários inteiros para propaganda religiosa, o que, ao pé da letra, não é exatamente legal.
O arrendamento de concessão pública, ou seja, você tem a concessão e você se compromete a usar para promover educação, entretenimento, etc., e você terceiriza essa responsabilidade que o Estado te deu para uma igreja.
Isso não é exatamente uma coisa correta de se fazer, então agir politicamente para expor essas situações e lutar no campo democrático para tentar acabar com esse tipo de situação dúbia, de situação que, se não é exatamente ilegal, é uma violação do espírito do princípio da concessão pública. A concessão é sua, não é da igreja, então por que você está empurrando seu espaço pra ela?
E eu acho que são esses dois caminhos. O da comunicação, da informação, de fazer com que as pessoas circulem, que elas percebam que existe vida fora da religião, que opiniões religiosas são só um outro tipo de opinião. Se você pode contestar um partido político, se você pode contestar uma corrente literária, por que você não poderia contestar uma igreja?
E atuar politicamente para apontar e tentar minar as vantagens indevidas que essas organizações têm. E essa segunda parte é muito mais difícil, mas, enfim, democracia é isso. É reconhecer problemas e reunir forças para levar as questões para o debate público e para disputar no voto. A gente tem que se preparar para fazer isso.
Quais as principais mudanças e atualizações feitas nesta nova edição do seu livro?
Essa nova edição do “Livro dos Milagres” passou por uma revisão ampla, um monte de coisas, pequenas atualizações, afinal, depois de dez anos, várias informações novas surgiram.
As sessões que mais foram reescritas e ampliadas foram as sobre aparições Marianas, que são aqueles fenômenos em que Maria, mãe de Jesus, supostamente aparece e fala, geralmente com um grupo de crianças, e transmite mensagens pedindo orações.
Mensagens de cunho político, muitas vezes, de que não vote nesse candidato, ou faça isso ou faça aquilo, ou o Papa está certo ou o Papa está errado e coisas do gênero.
A sessão sobre o padre Pio, que é um santo italiano, também cuja imagem é muito explorada por grupos conservadores, e que foi canonizado não há muito tempo.
Mas o fato é que saiu uma biografia muito completa do padre Pio, logo depois que a edição original do “Livro dos Milagres” tinha sido publicada, então eu não consegui integrar muita coisa daquela biografia na primeira edição do livro e agora ele está bem ampliado.
E a sessão sobre possessões. Possessões demoníacas, exorcismos e etc.
A sessão sobre aparições Marianas teve uma ampliação importante, que foi a inclusão de uma aparição que teria acontecido no Brasil, em Pernambuco, no início do século 20.
Envolvendo inclusive o nome de Lampião, há uma ligação muito forte com a cultura local. E é uma aparição que vem sendo… que forças conservadoras de direita vem tentando promover como ponto focal do conservadorismo da direita católica no Brasil.
Eles não conseguiram ainda, mas já tem dois livros publicados a respeito desse fenômeno.
A suposta mensagem que Maria deixou nesse evento foi fortemente anticomunista. Era para evitar que o comunismo venha ao Brasil. Era um negócio que, no contexto da época, na década de 30, e depois na época de Luís Carlos Prestes, tinha todo um contexto local.
E essa aparição vem sendo resgatada por forças conservadoras, que estão querendo promovê-la como um toque de clarim, um chamamento para a direita católica no Brasil.
Eles não conseguiram ainda, essa aparição não foi referendada pelas autoridades eclesiásticas como algo digno de crença, mas o pessoal está se esforçando, então eu incluí esse fenômeno no livro até para descrever o contexto sociopolítico em que ele ocorreu, apontar todas as discrepâncias, todas as inconsistências do relato.
Era uma tentativa de vacinar o público para o caso dessa aparição vir a ganhar fôlego na mídia, ser muito exposta, etc. Só tem dois livros publicados sobre o assunto, os dois muito, muito favoráveis, então é importante quem se preocupa com esse tipo de situação, esse tipo de exploração política, tomar cuidado e ficar de olho e ver o que vai acontecer a respeito.
E a parte sobre possessão demoníaca também cresceu bastante. Primeiro, também, porque, entre a primeira edição do livro e esta, saiu um estudo muito completo e muito detalhado sobre o caso que deu origem ao filme “O Exorcista”, que ainda é a história de possessão demoníaca mais conhecida, inclusive revelando a identidade do menino.
No filme é uma menina, mas a história real em que o filme se baseia envolvia um menino. A conclusão, na época, já era de que ele estava fingindo, então isso também está bem claro.
Então traz muitos detalhes mais saborosos da verdadeira história por trás do Exorcista. E também notando uma mudança na forma como inclusive autoridades religiosas olham para esta questão do exorcismo.
Quando a primeira edição do livro saiu, isso estava começando a mudar… não é que estava começando a mudar, mas a mudança estava começando a ficar clara.
E hoje em dia está muito mais clara que é. – inclusive nas denominações cristãs que se consideram mais intelectualizadas, que se consideram mais próximas do mundo secular – se você pegar a década de 70, a década de 80, a questão do exorcismo, da possessão estava sendo relegada pro campo do folclore e da psiquiatria.
Se pegar o próprio filme, “O Exorcista”, o padre, o herói do filme, que acaba fazendo o exorcismo, passa dois terços do filme tentando provar que, na verdade, não tem nenhum demônio, que a menina tinha problemas psiquiátricos e etc.
Ele só realmente parte para o exorcismo como último recurso. E essa visão de que o exorcismo é algo raro, que quase nunca deve acontecer, que são problemas psicológicos e psiquiátricos, ou fingimento, isso tem mudado drasticamente.
As igrejas, como a Igreja Católica, meio que se envergonhavam de ainda ter um ritual de exorcismo guardado na gaveta… isso mudou. Agora não… existe uma demanda enorme por exorcismo, existe uma escola de exorcismos no Vaticano.
Houve uma inversão, eu diria até uma involução do pensamento, mesmo nas denominações religiosas que buscam uma aproximação mais séria com a ciência e com o pensamento secular, que buscam se distanciar dessa ideia de que religião é só uma forma de superstição, que tentam realmente ter alguma sofisticação intelectual… mesmo esses grupos voltaram a abraçar a questão da possessão demoníaca e do exorcismo.
E eu acho que isso acontece, também, por razões políticas porque isso é algo espetacular, é algo que “vende”, que chama a atenção das pessoas. E acho que, por razões de marketing, mesmo essas denominações mais sérias – se é que dá para usar essa palavra – acabaram vendo que não dava para abrir mão desse instrumento, dessa ferramenta.
O que é uma coisa muito triste… é algo que me levou a reescrever o capítulo, chamando a atenção para esse dado, para esse fenômeno.
Em relação ao Brasil, qual seria, digamos assim, o principal milagre ocorrido localmente e que explicações o refutariam?
No Brasil, nós não temos – para nossa felicidade, na verdade – nenhum grande evento milagroso, uma fonte de água ou um rio onde as pessoas vão tomar banho e saem curadas, ou dizem que saem curadas.
Ou uma grande ilusão coletiva, como foi Fátima. A gente também não tem uma grande aparição Mariana que seja parte importante da nossa identidade nacional, como tem Guadalupe, no México, como tem Fátima, em Portugal, como tem Lourdes, na França.
Embora essa aparição da década de 1930, em Pernambuco, esteja-se tentando promovê-la, mas isso ainda não colou, e temos que torcer e trabalhar para que não cole.
O que nós temos no Brasil, muito, é a questão das curas. Tanto as supostas curas em cultos neopentecostais quanto as curas atribuídas a santos católicos. A gente tem, em São Paulo, as pílulas de Frei Galvão.
A gente tem as campanhas de oração por cura, etc. Então, no Brasil, os principais milagres são os milagres de cura proporcionados por oração, o que é, e eu explico isso no livro, um fenômeno estritamente estatístico. É o viés de confirmação funcionando perfeitamente.
É o caso exemplar porque… o que você tem? Você tem milhões de pessoas rezando, pedindo remissão de câncer ou pedindo curas de todos os tipos, e alguém consegue. E não é que consegue porque conseguiu um milagre.
É porque toda doença tem uma taxa de remissão espontânea, ou a pessoa está passando por um tratamento. Isso é uma coisa muito comum, também, a pessoa está fazendo quimioterapia e rezando e, quando o câncer some, é claro que foram as orações… a quimioterapia não teve nada a ver com isso. Mas, enfim.
Então, os milagres mais marcantes no Brasil, os que mais atraem pessoas são os relacionados a fenômenos de cura. Cura relacionada à oração.
No caso dos cultos neopentecostais, aquela coisa espetacular da adrenalina, das pessoas correndo no palco e todo mundo cantando e gritando, que também causa uma sensação de revigoramento muito forte.
E que, muitas vezes, desaparece assim que a pessoa chega em casa, mas você vê a pessoa revigorada e feliz na hora que a câmera está lá, mostrando ela durante o culto. Quando ela vai para casa e a dor volta, não tem ninguém olhando.
Eu acho que, no Brasil, os principais fenômenos milagrosos são esses associados à cura e que são, basicamente, efeitos placebo ou remissões espontâneas que são pinçadas estatisticamente. O processo de canonização, de produção de um santo católico, é exemplar nisso.
Porque o que acontece é: tem uma pessoa que tem um grupo de fiéis, de devotos que acham que essa pessoa devia ser promovida a santo.
Aí você faz uma campanha que é, basicamente, você sai espalhando panfletos dizendo “se você tem um parente que está com uma doença grave, reze para esse santo e, se der certo, avisa a gente”.
Porque as pessoas precisam coletar casos de milagres para poder fazer o processo de canonização, de transformação daquela pessoa em santo. Se você faz isso, espalha isso entre centenas, milhares, milhões de pessoas, você vai conseguir um, dois, três, quatro, cinco casos. Então é um fenômeno fundamentalmente estatístico.
Então, resumindo, o Brasil não tem, felizmente… o pessoal até fala “Ah! Mas tem Nossa Senhora Aparecida!”, mas o suposto milagre de Aparecida, que foi só retirar a estátua do rio, não é lá muito milagroso. O cara jogou a rede e voltou com uma estátua. Ok.
Não é um grande milagre como é a história de Nossa Senhora de Guadalupe, no México, em que o retrato de Maria apareceu milagrosamente no pano que o visionário estava carregando. O Brasil não tem um grande evento milagroso marcante.
Algumas pessoas tentam dizer que é Aparecida, mas Aparecida não é muito convincente porque é só uma estátua que tiraram do rio. O que o Brasil tem é realmente essa história de atribuir curas de doenças à oração ou a exorcismos.
Esse é o milagre característico da religiosidade brasileira. E hoje em dia, também, acho que cada vez mais, o milagre financeiro. “Fui no culto e minha empresa escapou da falência”.
Mas acho que são coisas muito individuais, eu não vejo nenhum grande evento milagroso de poder coletivo no Brasil.
“O livro dos milagres: O que de fato sabemos sobre milagres e outros fenômenos espantosos da religião”
O objetivo deste livro é facilitar o acesso do público às conclusões científicas acerca de eventos tidos como milagrosos, com explicações e contextualização. Fontes são citadas e, sempre que possível, um pouco do ambiente histórico que cercou cada caso e investigação é descrito, para ajudar na compreensão e oferecer um pouco de cor e perspectiva.
A principal motivação da obra é o argumento feito no século XIX pelo matemático William Clifford em seu ensaio A ética da crença: aquilo que você acredita ser verdade influencia as decisões que você toma, e com isso, o efeito que você tem sobre as pessoas ao seu redor e a sociedade em geral.
Para o autor, muitas pessoas tomam decisões importantes sobre suas vidas, e sobre as vidas dos que lhes são próximos, baseando-se em mitologia travestida de história, em metáforas levadas a sério demais, em superstição posando como dado concreto.