Natalia Pasternak na CPI da covid-19: “O que queremos dizer com ciência”
A presidente do Instituto Questão de Ciência, Natália Pasternak, defendeu a importância de divulgar a ciência, durante sua fala de abertura na CPI da Pandemia, do Senado Federal, no dia 11 de junho. Natália explicou como a ciência funciona como um processo de investigação da realidade. Confira transcrição da fala dela.
Por Natalia Pasternak
A comunicação da ciência, senhores, provou ser essencial durante a pandemia. Se a pandemia nos trouxe algum benefício, foi demonstrar que a ciência precisa, pode ser levada e compreendida por toda a população. Porque ela já está presente nas decisões que nós tomamos no dia a dia, seja como cidadãos, seja como gestores e parlamentares.
Para isso, a gente precisa entender um pouco do quê que afinal a gente quer dizer com ciência, quando a gente fala de defender a ciência. A ciência então é vista, por nós cientistas, como um processo, um método.
É um processo de investigação da realidade que pressupõe a nossa capacidade de mudar de ideia, diante de novas evidências. Desde que essas evidências sejam robustas. E da crítica dos nossos pares, quando apontam alguma falha metodológica, algum erro no nosso trabalho.
Com isso, a gente consegue produzir a melhor descrição possível da realidade em um determinado momento histórico, com as melhores ferramentas que a gente tem na mão naquele momento.
O momento histórico político, social, econômico pode mudar. As ferramentas podem mudar. Elas podem ser melhoradas e, com isso a gente pode mudar de ideia diante de novas evidências, se essas evidências forem robustas o suficiente.
O que a gente não quer dizer com ciência?
Ciência não é uma verdade absoluta, um dogma. Ciência não é qualquer coisa que seja publicada num artigo científico, como a gente tem visto muito durante essa pandemia. “Ah, mas saiu num paper”. Não é porque saiu em um periódico científico que automaticamente se torna ciência ou ciência de qualidade.
Também não é qualquer coisa dita por um cara de jaleco que tem vírgula Ph.D. depois do nome. E, definitivamente, não é qualquer coisa que seja ensinada numa universidade. Porque, infelizmente, nas nossas universidades a gente também ensina bastante besteira.
Portanto, a ciência não é uma questão de opinião. Não é uma questão do que eu enxergo versus o que você enxerga. Não é uma visão do mundo.
Alguém desenhou um número no chão ali. Ou é um 6 ou é um 9. Não é como eu vejo, é o que desenharam no chão. E, para descobrir o que desenharam no chão, a gente usa um método. Esse método se chama método científico. É um processo investigativo que vai investigar para descobrir que número, afinal, está no chão. É um 6 ou é um 9.
Não é uma questão de desrespeitar a opinião alheia. É questão que a ciência funciona buscando os fatos, e o fato é que é um 6 ou é um 9. Não dá para ser os dois.
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O simples fato de vivermos no século XXI já nos faz beneficiários da ciência e dos seus frutos, mesmo que a gente não se dê conta dessa verdade. Os objetos que nos dão conforto, que nos dão prazer, que nos transportam, que nos emocionam, que nos informam (até este livro) só existem da forma como existem por conta dos conhecimentos científicos. O cidadão que ignora fatos científicos básicos pode se tornar presa fácil de curandeiros e charlatões, gente que mente para os outros e, não raro, para si mesma.