Mudanças climáticas vão provocar mais terremotos e erupções

 Mudanças climáticas vão provocar mais terremotos e erupções

Terremoto na Síria: Ali Haj Suleiman

O sexto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, em 2021, revelou que a precipitação média de chuvas aumentou em muitas regiões do mundo desde 1950

Por Matthew Blackett, Coventry University

O clima da Terra está mudando aceleradamente. Em algumas áreas, a escalada das temperaturas vem aumentando a frequência e a probabilidade de incêndios florestais e períodos de seca. Em outros lugares, aguaceiros e tempestades estão ficando mais intensos ou as geleiras estão derretendo mais rápido.

O mês de julho, em 2023, foi uma clara ilustração do problema. Partes da Europa e do Canadá com incêndios florestais devastadores, enquanto Pequim registrou a maior precipitação de chuvas em pelo menos 140 anos. Olhando mais atrás, entre 2000 e 2019, as geleiras do mundo perderam cerca de 267 gigatoneladas de gelo por ano. O derretimento das geleiras contribui para o aumento do nível do mar (que atualmente cresce cerca de 3,3 mm por ano), e mais riscos costeiros, como erosão e inundações.

Além disso, as pesquisas sugerem que nossas mudanças climáticas podem influenciar não apenas os riscos na superfície da Terra. Mais especificamente, o incremento das taxas de chuva e o derretimento das geleiras podem exacerbar também perigos abaixo da superfície, como terremotos e erupções vulcânicas.

A seca na Europa e na América do Norte recebeu muita cobertura da mídia. Mas o sexto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, em 2021, revelou que a precipitação média de chuvas aumentou em muitas regiões do mundo desde 1950. Uma atmosfera mais quente pode reter mais vapor d’água, o que consequentemente leva a níveis mais altos de precipitação.

É interessante notar que os geólogos há muito tempo identificaram uma relação entre as chuvas e a atividade sísmica. No Himalaia, por exemplo, a frequência de terremotos é influenciada pelo ciclo anual de chuvas da temporada de monções do verão. Pesquisas revelam que 48% dos terremotos no Himalaia ocorrem durante os meses mais secos da pré-monção –março, abril e maio–, enquanto apenas 16% ocorrem em época de monções.

Durante a estação das monções de verão, o peso de até 4 metros de chuva comprime a crosta terrestre de maneira vertical e horizontal, estabilizando-a. Quando essa água desaparece no inverno, o efeito rebote desestabiliza a região e aumenta o número de terremotos.

Terremotos por temporada, entre 2003 e 2020

Gráfico mostra a flutuação sazonal de terremotos. No período pré-monção, o número de terremotos aumenta.
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Gráfico mostra a flutuação sazonal de terremotos. No período pré-monção, o número de terremotos aumenta.
Shashikant Nagale et al. (2022)/Geodesy and Geodynamics, CC BY-NC-ND

O aquecimento global pode intensificar esse fenômeno. Modelos de projeção estimam que a intensidade das chuvas de monções no sul da Ásia irá crescer no futuro como resultado das mudanças no clima. Isso poderia elevar o rebote do inverno e causar mais eventos sísmicos.

O impacto do peso da água na crosta terrestre vai além da chuva; afeta também o gelo glacial. Quando a última era glacial chegou ao fim, há cerca de 10.000 anos, o degelo de pesadas geleiras glaciais fez com que partes da crosta terrestre recuassem para cima. Esse processo, chamado de rebote isostático, fica evidente com as praias elevadas na Escócia, algumas das quais estão até 45 metros acima do nível atual do mar.

Evidências da Escandinávia mostram que a elevação de praias, somada à desestabilização tectônica da região, desencadeou vários terremotos entre 11.000 e 7.000 anos atrás. Alguns desses terremotos chegaram a ultrapassar a magnitude de 8,0 na escala Richter, o que indica destruição severa e perda de vidas. A preocupação é que o derretimento contínuo do gelo glacial hoje em dia possa ter efeitos semelhantes em outros lugares.

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Praias elevadas em Tongue Bay, na Escócia.
Patrick Bailey/Royal Scottish Geographical Society, CC BY-NC-ND

E quanto aos vulcões?

A ciência também encontrou uma correlação entre as alterações na massa glacial sobre a crosta terrestre e a atividade vulcânica. Há aproximadamente 5.500-4.500 anos, o clima da Terra esfriou brevemente e as geleiras começaram a se expandir no que hoje é a Islândia. A análise dos depósitos de cinzas vulcânicas espalhados pela Europa sugere que a atividade vulcânica na Islândia foi reduzida significativamente durante esse período.

Após o fim desse resfriamento, houve um aumento subsequente na atividade vulcânica, embora tenha demorado centenas de anos.

Tal fenômeno pode ser explicado pelo peso das geleiras que comprimem a crosta terrestre e o manto subjacente (a maior parte sólida do interior da Terra). Isso manteve o material que compõe o manto sob pressão mais alta, impedindo-o de derreter e formar o magma necessário para as erupções vulcânicas.

Entretanto, o degelo reduziu o peso e a pressão sobre a superfície da Terra, o que deu início a um processo de fusão descompressiva, permitindo que o manto derretesse. O magma líquido então resultante alimentou atividades vulcânicas subsequentes na região da Islândia.

Ainda hoje, esse processo é responsável por impulsionar erupções no atual país. Os vulcões islandeses Grímsvötn e Katla estão constantemente ativos durante o verão, quando a capa de gelo derrete.

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O vulcão Katla coberto pela geleira Mýrdalsjökull, ao sul da Islândia.
muratart/Shutterstock

Portanto, é possível que o degelo contínuo a partir do aquecimento global aumente a atividade vulcânica no futuro, ainda que o intervalo de tempo entre as alterações glaciais e a resposta dos vulcões seja tranquilizador por enquanto.

O impacto desse clima cambiante está ficando mais evidente, com fenômenos climáticos incomuns que se tornaram a regra, em vez da exceção. Já os efeitos indiretos das mudanças climáticas sob nossos pés não são amplamente conhecidos ou discutidos.

Isso precisa mudar se quisermos minimizar as consequências que já estão firmemente em curso.

Matthew Blackett, Reader in Physical Geography and Natural Hazards, Coventry University

This article is republished from The Conversation under a Creative Commons license. Read the original article.

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