Intercom 2022 discute os males da desinformação

 Intercom 2022 discute os males da desinformação

Intercom 2022 discute os males da desinformação

 

Intercom reúne cerca de 1.800 pesquisadores em João Pessoa discute o combate à divulgação de fake news e inverdades

 

Por Marcello Rollemberg
Jornal da USP

Desinformação, misinformation, mentira, pós-verdade, manipulações. Fake news. Todas essas expressões, que parecem – mas não necessariamente são – sinônimas, são, na verdade, o fruto amargo resultante de um mal comunicacional, tecnológico e contemporâneo: a propagação de informações falsas, de inverdades a respeito dos mais variados assuntos principalmente a partir das redes sociais, e que afetam diretamente a sociedade. Aí, sim, pode-se ganhar o nome genérico de fake news. Justamente para discutir esse tema cada vez mais amplo e ainda sem solução no horizonte que pesquisadores da comunicação de todo o Brasil estão se reunindo desde o último dia 5 na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), em João Pessoa, no 45º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. O encontro, que vai até o dia 9, reúne cerca de 1.800 congressistas, que apresentarão, ao final do evento, 965 artigos a respeito dos inúmeros temas que rondam as fake news e a desinformação no País. Depois de dois anos acontecendo de forma remota devido à pandemia de covid-19, esta é a primeira vez que os pesquisadores se reúnem presencialmente.

“O tema do Intercom é uma espécie de síntese do espírito do tempo, da agenda de pesquisa do campo de conhecimento da comunicação. A desinformação tem impactado instituições, grupos e indivíduos nas mais diversas dimensões”, afirmou ao Jornal da USP o professor da Universidade Católica de Pernambuco e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, a Intercom, Juliano Domingues. “As consequências desse fenômeno vão desde as mortes na pandemia a ameaças às eleições. E no centro desse fenômeno estão processos comunicacionais”, disse ele.

A diretora de Comunicação da Intercom e professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Ivanise Hilbig de Andrade, vai pelo mesmo caminho, ressaltando a importância da reunião de tantos pesquisadores da comunicação para discutir um tema que afeta a todos, indistintamente. “Essa temática é extremamente atual e preocupante pelo momento que a gente vive. É importante pensar como os comunicadores podem atuar, não apenas tecnicamente, no dia a dia, mas também politicamente e nas inserções junto à sociedade civil e às universidades”, ponderou ela.

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Apesar de já ter encontros e discussões desde o dia 5, a última quarta-feira – não coincidentemente o 7 de setembro que assombrava a tantos com fake news e ameaças à ordem institucional dos mais variados calibres sendo emitidas desde o Planalto Central – acabou pontificando em meio às importantes reflexões. A palestra oficial de abertura do congresso foi feita pelo jornalista e professor da Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA-USP) Eugênio Bucci, que lembrou que deve-se “buscar a âncora da palavra no momento que vivemos”.

“Se queremos vencer a desinformação, temos que saber explicar o que acontece. Temos que entender a história do conceito de informação para explicar a desinformação”, iniciou Bucci, que também é superintendente de Comunicação Social da USP. “Pós-verdade foi a palavra do ano do dicionário Oxford em 2016. E a expressão ‘fake news’ começou a se popularizar nessa época. Mas sempre houve fake news em todos os lugares, ela é uma falsificação da forma, antes de ser do conteúdo. É uma fraude da forma”, contextualizou o professor.

“E fake news pode contar verdades e embutir uma mentira em sua essência. Já a desinformação envolve, como conceito, a má intenção. A desinformação é um desvirtuamento do conteúdo, o perfeito oposto de tudo o que entendemos como informação. Ela anestesia e desativa a razão”, explicou, alertando que os padrões atuais de comunicação pelas redes são apelos “que não convidam ao diálogo”. “Não sou contra a tecnologia, mas sim contra o uso político da tecnologia”, concluiu.

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Se a fala de Eugênio Bucci pode ser vista como uma “importante conceituação filosófica” acerca de desinformação e fake news, como definiu a professora Elizabeth Saad, também da ECA, a mesa seguinte – da qual a professora fez parte – seguiu na discussão sobre o combate à desinformação e às fake news a partir de propostas e ideias mais diretas. O pesquisador e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Carlos D’Andrea, por exemplo, afirmou que uma das alternativas seria “desnaturalizar as plataformas tecnológicas, uma ‘desplataformização’”, algo que já vem sendo empregado. O ex-presidente americano Donald Trump, por exemplo, foi banido do Twitter.

“Devemos olhar mais na prática como a questão está sendo tratada, a diversidade de entendimentos que existe sobre desinformação e como o tema é entendido pela comunidade de checagem”, afirmou Elizabeth Saad, lembrando que os algoritmos das plataformas tecnológicas e seu entendimento acabam por privilegiar um cenário de desordem informativa. Segundo ela, a tarefa de combate à desinformação está longe de ser simples.

“A desinformação permanece atuando mesmo quando combatida. E combater não significa eliminar. A desinformação sempre ultrapassa limites”, afirmou ela, alertando que, justamente por essas razões, a sociedade civil deve atuar de maneira mais efetiva e que deve haver uma “institucionalização” dos códigos de conduta, inclusive das plataformas, que colaboram muito com a desinformação.

“É nossa função dar esclarecimentos, promover a cultura do debate, não ficar confortável com a mentira. Devemos ter um treinamento do olhar, do entendimento. Nossa função é desvelar, por mais que seja difícil. Até porque mitigar as fake news ou a desinformação não significa acabar com elas”, garantiu ela. “E esse também é um papel da universidade: falar para fora, participar mais e estar cada vez mais próxima da sociedade, discutindo e explicando. Não podemos ser reféns do meio digital e devemos ter clareza sobre isso. Afinal, o meio digital é ferramenta”, finalizou a professora da ECA.

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