Fiocruz Amazônia alerta para impacto da crise climática sobre a insegurança alimentar e hídrica

 Fiocruz Amazônia alerta para impacto da crise climática sobre a insegurança alimentar e hídrica

O Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia) foi uma das instituições presentes ao I Simpósio de Insegurança Alimentar e Nutricional e Segurança Hídrica da Amazônia, organizado pela Universidade Federal do Amazonas e pela Universidade Federal de São Paulo, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado do Amazonas (Fapeam), entre os dias 29/11 e 1/12. Representando o ILMD/Fiocruz Amazônia, o epidemiologista Jesem Orellana, chefe do Laboratório de Modelagem em Estatística, Geoprocessamento e Epidemiologia, palestrou no terceiro dia do evento sobre o tema “Condições de saúde e vulnerabilidades em populações tradicionais na Amazônia”, alertanso para o impacto da crise climática e das iniquidades regionais sobre a insegurança alimentar de populações vulnerabilizadas, tais como indígenas, migrantes, povos de terreiro de matriz africana, quilombolas, ciganos, pescadores artesanais e populações em situação de rua, que coabitam essa região, muitas das vezes na invisibilidade.

Orellana defendeu o processo de regionalização da saúde como forma de atendimento às reais necessidades de grupos que vivem na Amazônia. “É crucial promover o acesso à saúde oportuno e de qualidade na Amazônia, sobretudo em comunidades com limitada ou inexistente rede de atenção primária, de média e alta complexidade. Tão importante quanto garantir a proteção sustentável do meio ambiente”, defendeu o epidemiologista, observando que pesquisas, políticas e práticas adequadas às múltiplas realidades amazônicas são urgentemente necessárias em contexto de crise climática. “Não cabe mais falar em mudanças climáticas, já estamos mergulhados numa crise climática”, frisou.

O epidemiologista ressaltou que os eventos extremos ocorridos no Norte e no Sul do Brasil, e em países como a França e a Itália, ao longo de 2023, demonstram a magnitude do problema. “Se continuarmos a falar de mudança climática continuaremos naturalizando a gravidade do problema e isso é uma chave para, de fato, mitigarmos os problemas de insegurança alimentar e nutricional, bem como da crise hídrica. Será que o Rio Negro quebrando um recorde atrás do outro de seca extrema, em menos de dez anos já não configura uma crise climática?”, questionou. Para Orellana, a classe política precisa atentar para essa realidade de crise climática e estabelecer mecanismos de abastecimento de água potável e alimento para essas populações que se mantém isoladas e vulneráveis aos riscos de contaminação e morte.

O simpósio reuniu pesquisadores e especialistas de diversas instituições, que brindaram a audiência com a apresentação de estudos relativos ao tema da insegurança hídrica e alimentar preocupantes, segundo os quais a insegurança alimentar moderada e grave afetou 30,4% da população mundial em 2020 e em países da América Latina e Caribe, o percentual foi de 40,9%. No Brasil, entre 2004 e 2013, houve declínio da tendência de insegurança alimentar, porém entre 2017 e 2018 registrou-se um crescimento da tendência de insegurança alimentar (IA) grave, alcançando a assustadora cifra de 33,1 milhões de pessoa no início de 2022 e a Região Norte do País foi a mais impactada, com 25% das famílias em IA grave.

EXPERIÊNCIAS

A finalidade do simpósio foi identificar experiências que possam contribuir com a construção de uma agenda de pesquisa cidadã para o Amazonas. Jesem Orellana apresentou resultados de um apanhado de estudos realizados pelo LEGEPI demonstrando, na prática, o impacto causado pelo peso das desigualdades regionais, no Brasil, acentuado pelos efeitos da crise climática mundial na Região Norte do Brasil. “Tivemos excesso de mortes entre indígenas e não-indígenas no Brasil, em 2020, bem como nos diferentes impactos diretos e indiretos da pandemia de Covid-19. Além disso, em 2021, o número de internações por doenças como leptospirose, diarreias e gastroenterites de origem infecciosa presumível, mostraram-se mais desfavoráveis para a Região Norte, quando comparado ao ano anterior e às demais regiões do País”, citou.

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Também foi destacado o desenvolvimento de epidemias de doenças emergentes como Covid-19 e Mpox, caracterizando uma autêntica sindemia (sinergia entre diferentes epidemias ou desafios sanitários em contexto social ou econômico igualmente desafiador), coexistindo com doenças infecciosas e negligenciadas (malária, tuberculose, HIV/AIDS e febre amarela), e com a conhecida gravidade da desnutrição crônica em crianças indígenas menores de cinco anos (interação entre doenças). Segundo o pesquisador, eventos climáticos extremos têm efeitos diretos e indiretos sobre a saúde humana, tanto em termos de morbidade como de mortalidade. As doenças infecciosas de transmissão vetorial e àquelas veiculadas pela água e alimentos estão entre os exemplos mais comuns.

Jesem também alertou, de um lado, para o excesso de mortes por desnutrição (36,8%) em crianças menores de cinco anos da Região Norte, em 2021, comparado com 2020. De outro, o epidemiologista frisou a elevada taxa de mortalidade da diabetes melitus, em 2021 (33.1 por 100 mil habitantes) na Região Norte gerada por conta Diabetes melitus, doença associada à obesidade, sedentarismo e hábitos alimentares não saudáveis. No Amazonas, essa taxa chega a 40,3 por 100 mil, valor aproximadamente 50% maior que a média brasileira. “E estamos falando de números recentes, não de décadas passadas”, ressaltou, citando também como fator preocupante a recusa vacinal na Região Norte, sobretudo em crianças com um ano ou mais. “No fim de 2022, as coberturas vacinais da tetraviral (sarampo, caxumba, rubéola e varicela), da tríplice bacteriana (difteria , tétanos e pertussis) e da Hepatite A se situaram abaixo de 7%, 55% e 60%, respectivamente”, pontuou.

Fonte: Fiocruz Amazônia

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