Contaminação por microplástico afeta meio ambiente marinho brasileiro

 Contaminação por microplástico afeta meio ambiente marinho brasileiro

Cação-figuinho

Por Anderson Lima*

Estudo inédito realizado na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) demonstra como a atividade humana contribuiu não só para a contaminação por microplástico do cação-figuinho – espécie de tubarão inofensiva com grande incidência na costa brasileira –, mas também de todo o ambiente marinho da costa leste da América do Sul. “A teia alimentar estuarino-costeira encontra-se totalmente contaminada por microplástico. Essa contaminação mostra-se cíclica no ambiente, não havendo mais como retirar o poluente dela. Isso é um fato que mostra como a atividade humana tem inserido o microplástico no ambiente marinho”, alerta Roger Rafael Cavalcanti Bandeira de Melo na dissertação “Ecologia Alimentar e da Contaminação por Microplásticos em Rhizoprionodon porosus (Poey, 1861) na Costa do Estado de Pernambuco”, defendida em 2023 no Programa de Pós-Graduação em Oceanografia (PPGO) para a obtenção do título de mestre. O trabalho teve orientação do professor Mário Barletta, do Departamento de Oceanografia (DOcean) e do PPGO da Universidade.

De acordo com a pesquisa, a contaminação do tubarão por microplástico está fortemente ligada à alimentação do mesmo. “A maioria das espécies estuarinas demonstrou contaminação por microplásticos. Dessa forma, quando elas ficam disponíveis na região costeira para serem predadas pelo Rhizoprionodon porosus [nome científico do cação-figuinho], ele acaba se contaminando pelo microplástico que estava na presa. Esse microplástico está inserido no ecossistema de forma cíclica e, provavelmente, não há mais como retirá-lo”, explica o pesquisador. Inéditos, os achados ligam um sinal de alerta para o uso desse predador na alimentação humana, em especial, pelas comunidades ribeirinhas e de pescadores, pois o microplástico pode estar associado a substâncias nocivas.

“Em nossa convivência com a equipe de pescadores, observamos que essa população ribeirinha ingere muito o Rhizoprionodon porosus, por ser um dos tubarões que são mais facilmente capturados. E pode ser que essa carne esteja contaminada ou não seja tão própria para consumo”, adverte o pesquisador. “Uma vez que esse microplástico fica aderido ao corpo, ele vai causar um processo inflamatório naquela região, além de carregar substâncias extremamente nocivas para o organismo, como o mercúrio”, alerta Roger, que ressalta a importância de se estudar o impacto dessa ingestão do microplástico presente no Rhizoprionodon porosus. “É um precedente que a pesquisa também abriu”, avalia. A associação do microplástico com essas substâncias nocivas, a exemplo do mercúrio, porém, não foi pesquisada pelo estudo.

Para chegar aos resultados apresentados no estudo, Roger analisou o comportamento alimentar do predador a partir de uma metodologia que levou em consideração as estações de chuva e seca, a distância do predador para o litoral e a fase de desenvolvimento da espécie (recém-nascido, jovem ou adulto). De acordo com ele, a contaminação foi maior durante o período chuvoso – com exceção para os tubarões adultos, que tiveram pico de contaminação no período seco. Além disso, quanto maior a distância para a região costeira, menor a contaminação. “Essas variáveis nunca foram estudadas para essa espécie, o que torna o estudo bastante completo em relação à contaminação e ao caminho que esse microplástico faz até chegar ao predador de topo dentro da teia alimentar estuarino-costeira”, explica Roger, que reforça a importância da adição dos parâmetros espaço-temporais em pesquisas sobre contaminação de microplástico em elasmobrânquios, subclasse de peixes cartilagíneos que inclui os tubarões e as raias.

Roger explica que o cação-figuinho foi escolhido para o estudo por ser uma espécie abundante no litoral pernambucano. Foi analisado um total de 135 exemplares do tubarão, capturados de forma acessória ou involuntária por uma embarcação da colônia de pescadores de Barra de Jangada, em Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife. As coletas ocorreram na plataforma continental pernambucana, entre as divisas da Paraíba e de Alagoas, em um período de 13 meses, abrangendo os intervalos de início e de fim das estações de chuva e de seca. Todos os espécimes estavam contaminados com microplástico. Em especial, por fibras azuis e filmes pretos, originados principalmente da atividade pesqueira e industrial desenvolvida nas áreas costeiras e de estuário.

* ASCOM UFPE

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