Como seria o mundo sem nós?
“De volta aqui, mas outra paisagem/ De cegar a vista e emudecer/ Ainda aqui, cálida água/ Tão cristalina, reflito ao léu/ Às praias, você, não faltará/ Rastros de mim vão se apagar/ Como seria o mundo sem nós?”
Os trechos citados pertencem à letra da música “O mundo sem nós”, do Sargaço Nightclub. A canção ganhou um clipe, gravado ao vivo em 2019, e lançado nesta quinta (7) no canal de YouTube do duo pernambucano. Essa nova versão da música fará parte do primeiro álbum da banda, “Istmo”, programado para sair este ano.
“O mundo sem nós” já havia sido lançada no primeiro EP da Sargaço Nightclub, homônimo, de 2018. Ela foi composta por Marcelo Rêgo (vocal e guitarra) sob a inspiração do livro “The world without us”, de 2007, do jornalista americano Alan Weisman. A edição brasileira da obra encontra-se atualmente esgotada.
A música e o vídeo, cuja edição final havia sido concluída também no ano passado, ganharam uma nova dimensão devido às medidas de distanciamento social adotadas em todo o mundo, após o anúncio da pandemia do novo coronavírus.
Algumas semanas depois da redução das atividades e circulação humanas na Terra, começaram a surgir notícias sobre reações positivas do meio ambiente a essa inesperada situação. Em São Paulo, a poluição diminuiu, de acordo com dados de satélites, animais aproximaram-se de centros urbanos.
“A ideia do título do livro, caiu como uma luva sobre a letra que eu já vinha escrevendo, tanto que acabei tomando emprestado para nomear a música”, relembra Marcelo, formou a Sargaço junto Sofia França (vocal e guitarra).
No vídeo e nos shows “eletrificados”, a dupla é acompanhada por Ingno Silva (teclado), Alexandre Xaréu (baixo) e AD Luna (bateria).
Marcelo Rêgo ressalta que, durante a leitura, chamaram-lhe bastante atenção as detalhadas descrições dos mecanismos criados pela humanidade para tentar “dobrar” a natureza – cuja força é relatada como imensamente superior à dos seres humanos.
“É interessantíssimo quando o autor explica o funcionamento do metrô de Nova York de modo a impedir que toda a água não volte ao seu curso natural e invada a imensa estrutura de túneis subterrâneos criada”, exemplifica.
Além da leitura de Weisman, uma situação bem particular e pessoal contribuiu para a criação da letra de “O mundo sem nós”.
Durante um fim de semana na famosa praia de Porto de Galinhas, Marcelo Rêgo se pôs a contemplar a beleza natural que impressionava seus sentidos, ainda nas primeiras horas da manhã, de águas aquietadas.
“Peguei uma concha que achei belíssima. Mas, com o passar do tempo, esqueci dela em minha mão. Sem pensar muito, despedacei-a entre os dedos. E sangrou!”
Marcelo Rêgo acrescenta que a música também tem ligação com o mais intrigante personagem de Watchmen (1985), a emblemática história em quadrinhos de Alan Moore. “Os versos ‘me vi cair qual marionete que as cordas estica sem perceber o limite’ são uma alusão ao Dr. Manhattan, quando em um de suas idas a Marte”, revela.
Em relação à parte sonora, Marcelo diz que a intenção foi unir o estilo dreampop, do início etéreo da canção, a uma pegada mais rock – que provoca sensação de crescimento e intensidade.
Colaboração entre arte e ciência
“O mundo sem nós” leva em conta alertas que vêm sendo expostos por cientistas há anos, a respeito dos perigos que os efeitos deletérios da ação humana podem causar à natureza. E, por consequência, aos próprios humanos. Para Marcelo, a arte tem o poder de facilitar a compreensão da ciência por meio da sensibilização.
Na visão dele, teorias científicas podem ser democratizados pela via da inspiração artística, tanto de quem faz quanto de quem consome a música. “Afinal, a ciência está em tudo a nossa volta, é nossa própria vida. Foi por acreditarmos ser muito importante a reflexão, num momento como esse, de pandemia, que resolvemos antecipar o lançamento do clipe”, diz Marcelo.
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Quais são as evidências que a humanidade deixará no planeta. Quais estruturas humanas e o que produzimos que pode durar milhões ou até bilhões de anos e deixar nossa marca por aqui. O que estamos fazendo com nossos recursos e o que são os tecnofósseis.