Entenda por que evolução não é desenvolvimento
Evolução entrou no vocabulário das massas com o significado errado
Por Karin von Schmalz
Doutora em zoologia pela Universidade de Oxford
Existe um “pedantismo biológico” (como diz o Prof. Brian Cox) que tem toda a razão de existir e cujo uso errôneo me soa como unhas em um quadro-negro:
Evolução.
A palavra existia antes de Darwin dar um novo significado. Evolução quer dizer “mudança gradual” e só isso. Não tem direção nem ápice, é um processo de transformação lento ou em etapas que faz algo mudar, não necessariamente “pra melhor”.
Um edifício pode evoluir para ruínas, um incêndio evolui e transforma tudo em cinzas, um organismo pode evoluir e perder uma vantagem biológica porque a pressão ambiental momentânea favoreceu algo, em algumas gerações, que não vai ajudar quando essa pressão mudar. Muita coisa se extinguiu por causa disso.
Evolução não é desenvolvimento
A palavra que as pessoas querem usar é “desenvolvimento”. Desenvolvimento tem direção. Uma criança se desenvolve em um adulto, uma tecnologia é desenvolvida em algo útil, e, mesmo na metafísica, um espírito maligno pode se desenvolver em um espírito de luz, mas um espírito de luz pode evoluir para um demônio se começar a fazer maldades.
A confusão entre desenvolvimento – que tem um “objetivo” e direção certos – e evolução – que é qualquer mudança, sem direção – veio, claro, da religião.
Darwin e Wallace
Quando Darwin e Wallace descreveram o processo, a galera que se achava o píncaro da Criação surtou pesado. Como assim somos o resultado de variações aleatórias selecionadas naturalmente?
Somos criados à imagem e semelhança de nosso deus!!! Claro que eles queriam dizer que o Homo sapiens era o fruto de um plano DESENVOLVIDO por uma deidade (daí representando o ápice desse plano), mas se usassem o termo iriam ouvir “não é disso que Darwin fala”. Foi mais fácil embolar os termos.
Evolução virou sinônimo de desenvolvimento e entrou, depois de séculos usado corretamente, no vocabulário das massas com o significado errado.
Samba e espíritos
Escolas de samba “evoluem” na Sapucaí (não, elas avançam), espíritos “evoluem” unidirecionalmente (deveriam desenvolver-se em anjos), doenças sempre “evoluem” pra cura (seguem seu curso, que pode terminar em morte também), e por aí vai.
O resultado é que, mesmo entre meus colegas, a compreensão sobre a evolução biológica é fatalmente contaminada pela ideia de desenvolvimento.
O pior é que isso aconteceu em todas as línguas da cristandade. O mesmo erro acontece em italiano, alemão, inglês e por aí vai. É óbvio que foi proposital, já que informação é poder. “Bora esculhambar esse conceito em nome de Jesus”. Deu certo.
Seria ÓTIMO se os profissionais de comunicação, reais detentores do controle sobre a língua formal, dessem uma ajudinha e tomassem extremo cuidado com esse termo. Não tenham medo de dizer que algo se desenvolve quando é isso que você quer dizer.
Evolução não tem direção.
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por Reinaldo José Lopes e Pirula
Em uma viagem por Eras, continentes, nascimentos e extinções, dois brasucas nerds nos convidam a um mergulho na teoria da Evolução com as mais modernas e variadas descobertas científicas já feitas na história. Com a leveza e descontração de que só quem entende do assunto é capaz, os autores Reinaldo e Pirula respondem questões das mais diversas que, de algum modo, se relacionam à teoria mais importante da biologia.
Afinal, existe um elo perdido? De onde veio a nossa espécie? A humanidade está em processo de extinção? Por que irlandeses têm mais tolerância à lactose do que chineses? Por que leões matam filhotinhos? Como a Evolução explica a existência da homossexualidade? E o mais importante: sou fresco por não gostar de brócolis?
Principais Confusões com Relação à Evolução (P.C.R.E)
O paleontólogo e youtuber brasileiro Paulo Miranda Nascimento, o Pirula, publica vídeos sobre ciência, temas sobre comportamentos desde 2011. Com o intuito de informar as pessoas sobre inúmeras dúvidas e equívocos, ele produziu a série Principais Confusões com Relação à Evolução (P.C.R.E). Assista abaixo ao primeiro vídeo da série.
“Por que ainda existem macacos?”