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Especialista fala sobre processo de cidadania portuguesa para netos

O historiador e genealogista Gabriel Dias explica que os recursos hoje disponíveis permitem uma busca documental mais eficiente e favorecem a obtenção de prova da ancestralidade portuguesa

Os netos de portugueses que têm interesse em pedir a nacionalidade portuguesa precisam atender a algumas exigências para iniciar o processo. Dentre estas está a comprovação da nacionalidade do português de origem. Em princípio, os documentos que cumprem esta função são o assento de nascimento do português ou o batistério em Portugal. Entretanto, não são raros os casos em que os interessados não têm acesso a esses documentos.

Nessas situações é preciso tentar obter uma segunda via do assento de nascimento ou do batistério em Portugal. Para isso é necessário juntar uma série de informação e realizar uma pesquisa que ajude a localizar o local de nascimento do português e em que instituição os documentos foram registrados. Este processo de busca é o trabalho do historiador e genealogista Gabriel Dias, que trabalha para uma empresa especializada em mobilidade internacional. Nessa entrevista, ele conta um pouco sobre a história da imigração portuguesa no Brasil e explica como a tecnologia e as memórias de família podem ajudar na pesquisa documental.

Gabriel, como você passou a se interessar pela genealogia e pela ancestralidade portuguesa?

Desde pequeno, o meu ambiente familiar é fortemente marcado pela memória da imigração portuguesa para o Brasil. Um dia meu tio que é monge beneditino e membro da Academia de História de Portugal me apresentou ao campo genealógico e, desde então, tem sido o meu maior entusiasta. O uso da tecnologia da informação também foi importante no amadurecimento desse interesse.

Uma pessoa que tem um avô ou um bisavô português, mas que não tem um documento que comprova que esse ancestral era de Portugal, deve desistir do processo de nacionalidade?

Não. Com a tecnologia que disponível nos últimos anos, nós conseguimos identificar e rastrear uma ancestralidade portuguesa. Mesmo em casos em que a família tem poucas informações, como só o nome do português e a filiação dele, é comum nós conseguirmos encontrar informações que nos permitam chegar à documentação necessária ao processo de nacionalidade.

De que forma esse trabalho de busca é feito? 

Entre 1880 até mais ou menos 1920, a vaga de migração de Portugal para o Brasil gerou um conjunto de registros. Estamos falando de documentação existente tanto na administração pública portuguesa quanto na administração pública brasileira, para além daquelas que foram arquivadas em cartórios e conservatórias e até mesmo em muitas outras fontes registrais inusitadas.

Recentemente começamos a prospectar esses registros no sentido de saber que tipo de informação eles trazem e onde eles estão arquivados. Após a análise inicial nós transformamos esses registros de imigração em dados, o que nos permite realizar uma sobreposição das informações, ou seja, cruzá-las.

Como este processo, de fato, pode ajudar nos processos de nacionalidade portuguesa?

São vários registros, de várias naturezas, em vários locais, em dois países, que, após serem transformados em dados, nos permitem manipular as informações e agregá-las de forma a conseguir saber, por exemplo, de onde a família veio, em que ano veio, onde foram batizados ou em que local se declarou o nascimento. Com esses dados em mãos nos é possível constituir a prova genealógica de um brasileiro com avós portugueses e dessa forma permitir que esse descendente pleiteie todos os direitos inerentes a essa prova genealógica, como é o caso da nacionalidade portuguesa para netos.

Você citou anteriormente a migração portuguesa entre os anos de 1880 até 1920. Por que esse recorte temporal é relevante? 

Esse intervalo é importante porque, hoje, a maioria dos netos e bisnetos de portugueses no Brasil descendem de imigrantes desse período. É certo que o Brasil foi um local de migração portuguesa relativamente estável e contínuo nos últimos cinco séculos. Mas o que diferencia a imigração portuguesa dos últimos 100 anos, daquela do Brasil colônia, é que de 1880 em diante o fluxo migratório aumentou. Estima-se que entre 20 e 25 mil portugueses entraram nos portos brasileiros, por ano, nesse período.

Diante desse número tão significativo de portugueses a se estabelecerem no Brasil nesse período, é possível estimar o número de descendentes que podem pleitear a cidadania portuguesa?

Em termos de número que podem ser considerados oficiais, temos cerca de 5 milhões de netos de portugueses em território nacional. Essa é a estimativa feita por autoridades da comunidade luso-brasileira, com base em censos oficiais. Entretanto, acredita-se que a quantidade de netos e bisnetos seja muito maior.

Como as histórias e lembranças de família podem ajudar na busca pela comprovação da cidadania do português de origem? 

As memórias, apesar de muitas vezes serem negligenciadas, podem ser de grande ajuda na busca por informações que nos levem à prova documental da cidadania portuguesa. Já ouvi relatos de famílias que desistiram de constituir uma prova genealógica de ancestralidade portuguesa porque se sentiram desestimuladas por não saberem quase nada sobre os ancestrais. Mas, às vezes, qualquer informação sobre a origem, sobre o local, a década em que a família migrou, pode ser um indicador que, combinado com outros dados e registros, permitem que a gente consiga ter uma maior precisão no processo de busca. Foi o caso da minha família, onde um relato familiar de que uma das bisavós vinha de uma região que tinha neve e lobo. Suspeitamos logo que ela era originária da zona da Serra da Estrela, que é uma região bastante nevada em Portugal. Na pesquisa que realizei isso se confirmou.

Há mais algum ponto ou dica que você gostaria de destacar acerca deste processo de busca documental para comprovar a nacionalidade portuguesa de um ancestral?

Uma última coisa que gostaria de destacar é que muitas vezes as pessoas têm mais informações do que imaginam. Um exemplo são as certidões que elas têm em casa, especialmente as escritas à mão. Não é incomum que esses documentos contenham informações que, combinadas com os recursos tecnológicos que nós utilizamos, nos auxiliem na constituição de prova genealógica. Minha dica é então que as famílias vasculhem o que têm de papelada dentro de casa.

Website: https://martinscastro.pt

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